Esta declaração foi escrita pelo médico fluminense Luis Alberto Mussa Tavares, de Campos dos Goytacazes/RJ, em comemoração ao 60o. aniversário da Declaração Universa dos direitos do Homem (1948-2008) e ao 30o. aniversário da criação do Método Mãe-Canguru na Colômbia (1979-2009).
O dr. Luis teve a grandeza de distribuir este texto embrionário em Domínio Público, por isso, transcrevo aqui sem maiores ressalvas. Eu primeiro o fiz no meu blog pessoal, com menor repercursão do que eu imaginava e certamente muito menor valor que esta declaração merece.
Portanto, este é um blog de um artigo só, como aquele samba de uma nota só, do Jobim.
Apresentação
"E então minha criança linda, quero te dar o que trago na minha alma... Acolhe em ti, agora, com muita força e calor, aquilo em que me transformo para ti...: num arco-íris de amor." - Roberto Shinyashiki.
Um amor sem limites e uma entrega total dia e noite, com o corpo e a alma. Será o compromisso que deslumbrará o mundo. Mãe e filho estarão cobertos por um firmamento resplandeccente de suas luzes. Serão, talvez, imunes à chuva; poderão afundar numa nascente cristalina e perceber não mais que a vibração sonora de suas águas.
O fogo não os queimará, mas consiguirá transferir o calor de que o bebê necessita para que sua vda se encha cada vez mais de ansias de viver.
As harmonias serão todas doces que não deixarão de se olhar nem de se admirar. O amor desse ventre continuará acolhendo-o, porque a espera não foi em vão. A canção de ninar será como nos meses de espera, e, assim, as pulsações serguirão sincornizando-se para que esse formoso fruto venha a encontrar a mesma calma com que tranquilamente descansava enquanto crescia.
Acaso poderemos imaginar o mundo de magias e encantamento que se estabelece quando a mãe consegue, pela primeira vez, acariciar seu filho com suas mãos, quando o ergue e o aperta cotra seu peito e o coloca entre seus seios? Esses seios que o alimentarão com o leite da bondade humana na relação mais sincera, no maior ato de amor quando não existirá compromisso para lhe dar o alimento que fará eco e todo o seu ser, e, em troca, ele a olhará com o terno e sublime carinho. O pagamento será a beleza de sua presença e, assim, fazê-la feliz para o resto da sua existência.
Além disso, o peso não importará, somente a condição clínica dará a medida da felicidade que uma mãe sentirá quando consiga ter o filho em seus braços.
Abençoaremos o Dr. Luis Mussa Tavares por ter escrito Os Direitos Universais do Prematuro. Tal como aqui, nascem os iniludíveis deveres para que não se separem mãe e filho sob nenhuma justificativa.
Cabe à mãe mostrar o mundo a seu filho, e a idéia de família será sinalizada para ele, que a entenderá como algo que se constitui de laços sagrados.
Para o bebê prematuro, a Metodologia Mãe-Canguru necessita tão-somente do ser mais importante para ele: sua própria mãe.
Os direitos dos bebês prematuros são nossos próprios deveres. Inclinemo-nos diante da majestade desse ser pequenino e vamos protegê-lo, pois a beleza de seu futuro é nosso compromisso.
Héctor Martinez, neonatologista colombiano e "pai" do Método Máe-Canguru.
Artigo I
Todos os prematuros nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e consciência. Possuem vida anterior ao nascimento, bem como memória, aprendizado, emoção e capacidade de resposta e interação com o mundo a sua volta.
Artigo II
Todo prematuro tem o direito de ser, em todos os lugares, reconhecido como pessoa perante a lei.
Artigo III
Nenhum prematuro será arbitrarimente exilado de seu contexto familiar de modo brusco ou por tempo prolongado. A preservação desse vínculo, ainda quando silenciosa e discreta é parte fundamental de sua vida.
Artigo IV
Todo prematuro tem o direito ao tratamento estabelecido pela ciência, sem distinção de qualquer espécie, seja raça, cor, sexo, ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra condição. Assim, todo prematuro tem o direito de ser cuidado por uma equipe multidiscipinar capacitada a compreendê-lo, interagir com ele e a tomar decisões harmônicas em seu benefício e em prol de seu desenvolvimento.
Artigo V
Todo prematuro tem direito à liberdade de opinião e expressão, portanto deverá ter seus sinais de aproximação e afastamento identificados, compreendidos, valorizados e respeitados pela equipe de cuidadores. Nenhum procedimento será considerado ético quando não levar em conta para a sua execução as necesssidades individuais de contato ou recolhimento do bebê prematuro.
Artigo VI
Nenhum prematuro será submetido à tortura nem a tratamento ou castigo cruel, desumano ou degradante. Sua dor deverá ser sempre considerada, prevenida e tratada por meio dos processos dispnibilizados pela ciência atual. Nenhum novo procedimento doloroso poderá ser iniciado até que o bebê se reorganize e se restabeleça da intervenção anterior. Negar-lhe esse direito é crime de tortura contra a vida humana.
Artigo VII
Todo prematuro tem direito ao repouso, devendo por isso ter respeitados seus períodos de sono superficial e profundo que doravante serão tomados como essenciais para seu desenvolvimento psíquico adequado e sua regulação biológica. Interromper de forma aleatória e irresponsável sem motivo justificado o sono de um prematuro é indicativo de maus-tratos.
Artigo VIII
Todo prematuro tem direito inalienável ao silêncio que o permita sentir-se o mais próximo possível do ambiente sonoro intrauterino, em respeito a seus limiares e à sua sensibilidade. Qualuer fonte sonora que desrespeite esse direito será considerada criminosa, hedionda e repugnante.
Artigo IX
Nenhum prematuro deverá, sob qualquer justificativa, ser submetido a procedimento estressate apliado de forma displicente e injustificada pela Euipe de Saúde, sob pena de a mesma ser considerada negligente, desumana e irresponsável.
Artigo X
Todo prematuro tem direito a perceber a alternância entre claridade e penumbra, que passaraão a representar para ele o dia e a noite. Nenhuma luz intensa permanecerá o tempo inteiro acesa, e nenhuma sombra será impedida de existir sob a alegação de monitorização contínua sem que os responsáveis por esses comportamentos deixem de ser considerados displicentes, agressores e de atitude dolosa.
Artigo XI
Todo prematuro tem direito, uma vez atingidas as condições básicas de equilíbrioe vitalidade, ao amor materno, ao calor materno e ao leite materno, que lhe serão oferecidos pelo Método Mãe-Canguru. Caberá à Equipe de Saúde prover as condições estruturais mínimas necessárias a esse vínculo esasencial e transformador do ambiente prematuro. Nenhum profissional ou cargo de comando, em nenhuma esfera, tem a prerrogativa de impedir ou negar a possibilidade desse vínculo que é símbolo da ciência tecnocrata redimida.
Artigo XII
Todo prematuro tem direito a ser alimentado com leite de sua própria mãe, ou na falta dela, de outra mulher, tão logo suas condições clínicas o permitirem. Deverá sua sucção corretamente trabalhada desde o início da vida e caberá à Equipe de Saúde garantir-lhe esse direito, afastando de seu entorno bicos de chupetas, chucas ou qualquer outro elemento que venha interferir negativamente em sua sucção saudável, bem como assegurar-lhe seu acompanhamento por profissionais capacitados a facilitar esse processo. Nenhum custo financeiro será considerado demasiadamente grande quando aplicado com esse fim. Nenhuma fórmula láctea será displicentemente prescrita, e nenhum zelo será descuidadamente aplicado sem que isto signifique desatenção e desamparo. O leite materno, doravante, será considerado e tratado como parte fundamental da sua vida.
Palavras Finais
A história dos direitos essenciais do recém-nascido pré-termo se confunde com a história do desrespeito com que a raça humana trata seu semelhante. Desde o período mais longíncuo do qual se tem notícia, e até muitas vezes na atualidade, o bebê pré-termo, por sua fragilidade e alta mortalidade, continuadamente recebeu da ciência oficial o mesmo descaso que tradicionalmente sempre foi destinado aos mal-formado e aos incuráveis. A falta de uma perspectiva de tratamento, somada à ausência de um ambiente adequado para a recuperação destes bebês, reduziu, na maior parte das vezes, as esperanças de sobrevivência aos cuidados maternos, aos quais eram transferidas as responsabilidades das tentativas e dos manejos salvadores.
Foram, portanto, o vínculo e a habilidade materna, natural e instintiva, as forças maiores que mantiveram a vida desses pequenos bebês ao longo dos séculos.
Não é incomum ouvirmos até hoje relatos a cerca de pequenos bebês criados em caixas de sapatos envolvidos em algodão e alimentados por gotas maternas de sobrevivência.
"Um bebê sozinho não existe. Existe um bebê e sua mãe", já dizia Winnicott. Em finais do século XVIII, com a invenção dos primeiros protótipos das incubadoras, nasciam as luzes de um conhecimento que o século seguinte conheceria como a neonatologia.
A ciência, a partir daí investida de tecnologia mecânica, passou a exercer papel essencial no tratamento dos aspectos ligados à prematuridade, bem como na elevação do índice de sobrevivência desses bebês.
Assumiu a palavra final então, por mérito próprio, a ciência oficial.
A mãe, milenar responsável pela preservação da vida do bebê pretermo, foi radicalmente exilada de sua companhia, e seu papel cuidador desprezado no processo de sua recuperação. O avanço da ciência possibilitou o conhecimento da fisiopatologia das principais ameaças que a condição premtura impunha à sobrevivência desses bebês, transformando a incipiente ciência da neonatologia na forma única de um tratamento indicutivelmente aceita.
Em meados do século XX, com a descoberta do surfactante, tornaram-se cada vez mais desvendados os segredos que permitiram tratar com sucesso bebês com pesos cada vez menores em condições de saúde cada vez mais desfavoráveis. A morte passou a poupá-los de forma cada vez mais frequente.
Rapidamente foi-se perdendo o parâmetro do que era incurável e do que era inviável. O céu, à essa altura, era o limite. Teve-se assim, por algum tempo, a impressão de que a ciência e o divino falavam o mesmo idioma. Não havia mistérios impossíveis de serem desvendados nem condições clínicas incapazes de serem tratadas pela quimica, máquina, técnica e autoconfiança que iam se transformando em única evidência.
A ciência mergulhava em grande êxito e euforia quando percebeu a necessidade de refazer o caminho perdido atalhos atrás.
Se por um lado os mistérios de sobrevivência já não eram mais um problema por tanto conhecimento acumulado, por outro a avaliação da qualidade de vida que essa cura alcancada imprimia a esses sobreviventes deixavam transparecer sinais preocupantes.
Com o afastamento materno, trocado por hiperexposição em ambientes cada vez mais hostis e sem afeto, carregados de índices anti-fisiológicos de ruído, luz, dor, manipulação e desrespeito aos desejos de comunicação e afastamento do pré-termo, fez surgir um novo padrão de seres vivos, vítimas do cuidado desatento às suas necessidades, vítimas do tratamento desrespeitador de suas habilidades e vítimas da atenção à saúde desprezadora de suas capacidade de interação com o meio: nascia a síndrome do bebê de UTI, salvo da morte e esquecido em sua integridade.
Esses bebês cresceram e, vítimas do descaso e da parcialidade da ótica terapêutica, perpetuaram suas necessidades de cuidados.
Era preciso, então, percebeu a ciência ao desconsiderar Deus, atingir um padrão de cura que permitisse chegar muito além da terapia clínica calcada em índices físicos e laboratoriais.
Era preciso cuidar da emoção da complexidade da vida inteira de nossos pequenos semelhantes.
Aqui e ali passaram a surgir pensamentos, práticas e ajustes isolados na tentativa de recuperar o tempo perdido.
Foi na Colômbia, entretanto, em 1979, que os médicos Edgar Rey e Hector Martinez fizeram chegar à luz o mundo o Método Mãe-Canguru (MMC), todo feito de tecnologia humana imprescindível e insuperável.
Nascida de condições precárias de estrutura de atendimento, a grandiosidade doMMC em pouco tempo expandiu seus limites sul-americanos, alcançando rapidamente o mundo inteiro como uma nuvem de frescor contra o cansaço do insuperável e as deficiências do indestruível. Recebeu versões em cada país onde foi adotado, e, por ter sido adotado em todo o planeta marcou o nascimento de um novo paradigma de atenção ao recém-nascido pré-termo.
A mãe é trazida de volta ao convívio com o seu filho, reabilitando o seu papel histórico de principal cuidadora e de insubstituível valor. A ciência abre mão de impor sua parafernália como últia palavra e transfere ao amor, ao calor e ao leite materno os papéis de destaque no processo de cura. A espécie humana descobre na tecnologia humana o valor da preservação da vida que tentou encontrar por mais de dois séculos sob o jugo da tecnologia mecânica.
O bebê de UTI recebe a chance de ser substituído pelo bebê canguru.
Definitivamente um novo tempo para a humanidade inteíra.
Um abraço.
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